domingo, 18 de novembro de 2007

Religião, uma ilusão?

Freud


Prezados amigos,
As 26 mensagens que enviei até agora foram tiradas quase exclusivamente de apenas 3 autores: Elisabeth Lukas (Psicoterapia e Logoterapia), Anselm Grün ( Espiritualidade) e Hans Küng (Teologia e Ecumenismo). A 26ª mensagem que envio neste momento encerra esta primeira etapa, voltada preferencialmente para os três autores com quem mais me ocupei. Os três totalizam 20 livros traduzidos por mim. Faltam muitos ainda antes que possamos chegar ao total de 77 livros traduzidos. Permito-me agora fazer alguns dias de pausa. Novos textos só deverão ser enviados após o dia 20 do corrente. Agradeço a todos pela atenção dedicada a esses textos, particularmente aos que me honraram com seus comentários e agradecimentos. Desejo a todos muito proveito em seus trabalhos e ocupações.
Vejam, por favor, no anexo a mensagem número 26.
E até breve.
Carlos Almeida Pereira, Campina Grande/Pb
08.11.2007
Em seu livro “FREUD E A QUESTÃO DA RELIGIÃO” (Verus Editora, 2005) Hans Küng ocupa-se com o ateísmo de Freud. A tradução do título original do livro é “Freud e o Futuro da Religião”, alusão à obra escrita por Freud nos seus últimos anos, “O Futuro de uma Ilusão”. Nesta obra Freud prevê que as crenças religiosas não irão durar muito, devendo ser em breve substituídas pela “fé” na ciência. Hans Küng, como crente esclarecido, analisa neste livro os argumentos de Freud, além de traçar um marcante perfil do pai da psicanálise.

26. Religião, uma ilusão?

O ATEÍSMO DE FREUD - O ateísmo de Freud não veio do berço. Ele foi educado na religião judaica, mas tornou-se ateu desde os tempos de estudante. Já era ateu antes de ser psicanalista. E como psicanalista, procurou explicar a origem da religião pela psicanálise. As idéias religiosas, para ele, não são fruto da experiência nem resultados do pensamento, mas sim “ilusões, realizações dos desejos infantis mais antigos, mais profundos e mais urgentes da humanidade”.
INFLUÊNCIA DE FEUERBACH - Os argumentos para seu ateísmo pessoal, Freud os tirou sobretudo do filósofo alemão Feuerbach. Já em Feuerbach pode ser encontrada uma fundamentação psicológica do ateísmo: desejos, fantasia ou imaginação seriam os responsáveis pela projeção da idéia de Deus e do mundo das aparências ou dos sonhos religiosos. Assim como a teoria do ópio de Marx, a teoria da ilusão de Freud também está baseada na teoria da projeção de Feuerbach. O que ele apresenta de novo é apenas o aprofundamento psicanalítico.
FRACA ARGUMENTAÇÃO - Mas isto implica que as razões apresentadas contra o ateísmo de Feuerbach se aplicam também a Freud. Assim como o ateísmo de Feuerbach se comprova como uma hipótese que em última análise não tem fundamento lógico, também o ateísmo de Freud tem que ser apresentado como uma hipótese que não se comprova como logicamente necessária. É verdade que Freud retomou a teoria da projeção psicológica de Feuerbach e analisou-a psicanaliticamente, no tocante aos seus pressupostos inconscientes. Com isto, no entanto, ele não apresentou uma prova independente para a teoria da projeção. Pois também Freud, admitindo essa teoria, se interrogou como ela poderia ser explicada do ponto de vista da história e da psicologia. E foi precisamente esse pressuposto que se demonstrou como. em última análise, carecendo de fundamento.
PROVAR QUE DEUS NÃO EXISTE? - Freud teve o grande mérito de haver mostrado até que ponto o inconsciente determina o ser humano e a história da humanidade. Mas da inegável influência dos fatores psicológicos sobre a religião e o conceito de Deus não se pode ainda concluir coisa alguma sobre a existência ou não-existência de Deus. Também da inegável influência dos fatores psicanalíticos inconscientes sobre a religião e o conceito de Deus não se pode concluir coisa alguma sobre a existência ou não-existência de Deus.
CONCRETIZANDO – Concretizemos isto na crítica central de Freud à religião: “As idéias religiosas são realizações dos mais antigos, profundos e prementes desejos da humanidade”. Certo, dirá também aquele que crê em Deus. Mas ao mesmo tempo ele há de admitir:
• Certamente a religião, como mostra Marx, pode ser um ópio, um meio de acalmar e de consolar (ou de reprimir) a sociedade. Mas ela não tem necessariamente que ser isso.
• Certamente a religião, como mostra Freud, pode ser ilusão, expressão de uma neurose e imaturidade psíquica. Mas não tem necessariamente que ser isso.
• Certamente toda fé, esperança e amor dirigidos a um ser humano, a uma causa, ou a Deus, contém um elemento de projeção. Mas nem por isso seu objeto tem que ser mera projeção.
• Certamente a fé em Deus pode ser fortemente influenciada pela atitude da criança em relação ao pai. Mas mesmo assim Deus pode existir.
EXPLICAÇÃO PSICOLÓGICA - O problema não é, portanto, o fato de a fé em Deus poder ser explicada psicologicamente. Do ponto de vista psicológico, a fé em Deus sempre apresenta estruturas e elementos de projeção, mas nem por isso ela pode ficar sob suspeita de ser mera projeção. Também todo aquele que ama projeta necessariamente sua própria figura sobre a pessoa amada. Mas significaria isso que a pessoa amada não exista, ou mesmo que essencialmente ela só exista como ele a vê e a imagina? Quem sabe se com suas projeções ele não poderia apreendê-la até com mais profundidade do que um observador neutro seria capaz de fazê-lo de fora?
ILUSÃO INFANTIL? - A religião seria um desejo? E por isso Deus só poderia ser uma fantasia de desejo humano, uma ilusão infantil, ou mesmo uma idéia neurótica de loucura? Ao desejo de Deus pode perfeitamente corresponder um Deus real. E por que se haveria de desqualificar universalmente todo e qualquer desejo? Não é o desejo uma coisa inteiramente humana, tanto em pequena como em larga escala, dirigido para os bens desta terra, para o próximo, para o mundo e – por que não também – para Deus?
Texto baseado em Hans Küng, Freud e a Questão da Religião, pág. 64 ss. - Tradução e adaptação de Carlos Almeida

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