sábado, 20 de setembro de 2008

Livro Envelhecer e ser feliz

A velhice serve a dois senhores: o que a maltrata e o que a venera.


Saldanha Coelho


Sobre ele, por motivos vários, recaem severas críticas ou generosos elogios. Resta saber até que ponto essa avaliação sensibiliza o velho; em que dimensão o atinge, nessa idade de poucas ambições e de quase nenhuma esperança.

Leio nos jornais de hoje, indignado, uma notícia procedente de Viena sobre "a maior e mais brutal série de assassinatos já cometidos na Europa desde a Segunda Guerra".

Já são 49 e podem passar de uma centena os casos de velhos assassinados no Hospital Lainz, na capital austríaca. Os crimes foram cometidos por quatro enfermeiras-auxiliares, todas já presas. Existe tragédia pior do que esta?

Com exceção de alguns países, os séculos XVI e XVII foram em geral muito impiedosos com as pessoas de idade. Na Bulgária, ao contrário, a velhice foi valorizada.

A longevidade era considerada uma virtude. Os puritanos também admiravam os velhos. Diderot dizia: "Honra-se a velhice, mas ninguém gosta dela". A nós parece uma grande verdade. A sociedade se afasta dos velhos como se se tratasse de uma espécie estranha".

Já o grande Goethe achava a velhice uma idéia gélida, abstrata e decepcionante.

Ao longo da história, os velhos receberam tratamento diverso, às vezes humanitário , às vezes insensível, desumano. Via de regra, entretanto, sempre foram maltratados, postos de lado.

Agora mesmo, entidades especializadas comentam o drama que a velhice representa para os europeus, como se ainda estivéssemos vivendo em época muito remota.

Todos os anos morrem de frio milhões de velhos no inverno. No verão, abandonados pelas famílias, que gozam férias entre junho e agosto, morrem de fome por falta de assistência. Este registro é da Age Concern, organização ligada à Universidade de Londres, para a qual é catastrófica a situação dos velhos na Europa.

Informa a Age Concern que na Inglaterra 15% da população de 57 milhões de habitantes têm idade acima de 65 anos, com a metade deles dependendo completamente do Estado - que hoje gasta o equivalente a 70 bilhões de dólares anuais com pensão e assistência social.

Imagine se não gastasse?

A Diretora do Instituto de Gerontologia de Londres, Anthea Tinker, prevê que a situação irá se agravar ainda mais, considerando-se que o número de idosos deve aumentar pelo menos 30% nos próximos 20 anos, por causa da queda da taxa de natalidade e do aumento de expectativa de vida na Europa.

Na França, cresce o número de velhos abandonados pelas famílias e sob a guarda do Estado. Ali vivem 300 mil idosos com mais de 65 anos, totalmente abandonados em asilos do governo. Na França, 14% da população são idosos. Destes, 35% dependem de ajuda por viverem sós, em muitos casos sem pensão alguma e abandonados pelas famílias.

Nos Estados Unidos, a situação é igualmente preocupante. No ano 2000 havia ali sete milhões de velhos com o mal de Alzheimer. Esta enfermidade é caracterizada pela degeneração acelerada dos neurônios, que causa perda da memória, falta de concentração, dificuldades na fala e na coordenação motora.

Típico da velhice, o mal de Alzheimer atinge, segundo estatísticas internacionais, seis de cada dez doentes que apresentam sinais de demência senil. No Brasil, de acordo com IBGE, no ano 2000 nossa população de idosos era de 15 milhões. E quantos destes estarão vivendo os mesmos problemas de outros velhos - sem meios de subsistência, doentes e solitários?

Shopenhauer é que tinha razão. Afirma ele: "Os anos que precedem a decrepitude constituem a fase mais feliz da vida, quando a saúde é boa e se dispõe de dinheiro suficiente para compensar as forças em declínio.

A velhice pobre é a maior desgraça que pode existir.

" Em certas tribos indígenas, paupérrimas, dá-se toda assistência às pessoas de idade.

São as primeiras a receber os alimentos e os melhores lugares nas choças.

Nunca ficam sozinhas, tendo ao lado um dos filhos, e o que dizem merece toda atenção. Os incas temiam, veneravam e obedeciam os velhos; e estes podiam castigar os adolescentes que não se comportassem bem. Entre os que gostam dos velhos, existe um consenso de que a longevidade é uma demonstração de que a pessoa levou a vida de maneira sábia.

É preciso ser dotado de virtudes singulares para resistir às provações da natureza e da sociedade em que vivem. Os gregos foram críticos cáusticos dos velhos, considerando a decrepitude um flagelo pior do que a morte. Achavam eles que era melhor morrer do que viver, quando acaba a mocidade, "pois muitas desgraças se apossam da alma humana: destruição do lar, miséria, morte dos filhos, enfermidades etc." De que vale a imortalidade sem a juventude? - questionavam.

O velho parece antipático às crianças, e as mulheres o desprezam.

Menandro completa este quadro de desalento dizendo que "não é possível haver entre um ente mais infeliz do que um velho apaixonado, a não ser outro velho apaixonado". Quem salvava esse negativismo era Platão. Octogenário, afirmava: "Objeto algum de culto poderemos possuir mais digno de respeito que um pai ou um avô, uma mãe ou uma avó cheios de idade.

"E também Victor Hugo enaltece a velhice na sua obra Os miseráveis: "É adorável a graça, quando unida às rugas. Existe uma aurora indescritível na velhice feliz."

Rembrand disse que a velhice é um amadurecer da generosidade e pintou seu próprio envelhecimento numa série de retratos, Pablo Neruda escreveu uma Ode à idade.

Fonte : Site Velhos Amigos

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