domingo, 16 de dezembro de 2007

Iracema em alemão?

IRACEMA, escrita por José de Alencar em 1865, não teve de início grande aceitação do público brasileiro. Só com o passar do tempo é que foi adquirindo a grande popularidade de que desfruta hoje, a ponto de ser considerada “uma das obras máximas do Romantismo Brasileiro” (Enciclopédia Larousse Cultural). O centenário do romance foi comemorado com a primeira edição feita fora do eixo Rio-São Paulo, a edição especial pela Universidade Federal do Ceará. Recentemente, com o objetivo de difundir obra de tão elevado valor literário e poético, além de tão autenticamente brasileira, a mesma UFC lançou duas edições bilíngües do romance: em português-francês e em português-alemão. A organização dessa última ficou a cargo da Dra. Ingrid Schwamborn, que fez também a dificílima tradução do texto de José de Alencar para o alemão. Além do próprio romance, o livro contém diversas contribuições de autores do Brasil e da Alemanha, além de numerosas interpretações e comentários. Minha participação nesse volume consistiu em traduzir para o português as contribuições escritas originalmente em alemão. Abaixo alguns trechos explicativos, e uma pequena amostra da edição bilíngüe.

René Teixeira Barreira - “O lançamento de ‘Iracema’ em português/alemão vem alargar as fronteiras de divulgação dessa obra e destacar o caráter universal da obra de José de Alencar, que retrata a nacionalidade brasileira e se tornou a mais representativa do Indianismo no Romantismo brasileiro. Foi feliz a iniciativa de se confiar a tradução desse livro fundamental à Ingrid Schwamborn, uma profunda conhecedora da obra de José de Alencar, com várias publicações sobre este autor. Iracema em língua alemã é um convite à redescoberta do Brasil. -

Maria Elias Soares - O livro não é apenas uma reedição de Iracema, não é apenas uma tradução da Lenda do Ceará para o alemão. Ingrid Schwamborn quer conduzir um novo olhar sobre Iracema. Estudiosa da obra de José de Alencar, pesquisadora da presença holandesa no Brasil, além de conhecedora do leitor alemão, Ingrid não se contenta em oferecer “notas do tradutor” para esclarecer algumas decisões indispensáveis ao labor tradutório. Agora vem a lume esta edição ricamente ilustrada, graças à competência e persistência de Ingrid Schwamborn e à visão acadêmica, cultural e administrativa do Reitor da UFC, René Teixeira Barreira. -

José Gomes de Magalhães - Em aqui chegando, no final de 1968, Ingrid Schwamborn foi por assim dizer recepcionada com a edição especial do centenário de Iracema, de 1965 – e entendeu só parcialmente o texto poético, misterioso, como confessou a este escriba, mas fez a si mesma a promessa de um dia pesquisar e traduzir o texto para o alemão. Agora, ano de 2006, a UFC, na pessoa de seu Reitor, Professor René Teixeira Barreira, manifesta-se pelo projeto da tradução de Iracema, e publicá-la em mais uma edição bilíngüe. Ele incentivou Ingrid Schwamborn a abraçar a tarefa e pôr de pé seu sonho antigo de traduzir um dia Iracema para o alemão. É o tempo da colheita. -
Helmut Feldmann - Alencar publica o romance Iracema, a narrativa mais representativa da corrente indianista do romantismo no Brasil. É a realização do objetivo ambicioso de criação de um mito literário de fundação da identidade nacional do Brasil. É uma obra que é hoje uma das narrativas mais populares da literatura brasileira, merecendo ser considerada uma etapa autêntica no longo trajeto da nação à procura de sua identidade. -
Claudius Armbruster - A tradução do romance Iracema por Ingrid Schwamborn, na edição bilíngüe ilustrada da Universidade Federal do Ceará, cria condições para que finalmente também na Alemanha a obra-prima de José de Alencar possa ser apreciada por um número maior de leitores. -
Ana Miranda - Ao criar seu romance Iracema, José de Alencar estava inspirado por um fenômeno de quintessência. Como se fosse uma Eva inocente, sem pecado, num outro jardim do Éden, a personagem Iracema povoa nossa infância, nossa juventude e idade adulta. Com o passar do tempo, deixou de ser apenas uma personagem histórico-ficcional e veio se carregando de mais significados. Tornou-se uma espécie de Eva que representa todas as indígenas, todas as cearenses, todas as brasileiras, todas as mulheres, enfim. É a Eva de nossa alma e nossa imaginação, que exerce uma função semi-religiosa. Acompanha-nos como se fosse uma delicada menção à nossa mãe, a natureza, purificada por uma linguagem idílica, em que o lado terrível de nossa existência torna-se poesia. -

Além, muito além daquela serra, que ainda azula no horizonte, nasceu Iracema.
Weit, sehr weit hinter jenen Bergen, die dort blau am Horizont erscheinen, wurde Iracema geboren.
Iracema, a virgem dos lábios de mel, que tinha os cabelos mais negros que a asa da graúna e mais longos que seu talhe de palmeira.
Iracema, das Mädchen mit den Honiglippen, hatte Haare, die schwärzer als die Feder der Graúna-Amsel und länger als eine schlanke Palme waren.
O favo da jati não era doce como seu sorriso; nem a baunilha recendia no bosque como seu hálito perfumado.
Der Honig der Bienen war nicht so süß wir ihr Lächeln; auch die Vanille-Orchidee im Wald duftete nicht so stark wie ihr wohlriechender Atem.
Mais rápida que a ema selvagem, a morena virgem corria o sertão e as matas do Ipu, onde campeava sua guerreira tribo da grande nação tabajara. O pé grácil e nu, mal roçando, alisava apenas a verde pelúcia que vestia a terra com as primeiras águas.
Iracema, II
Schneller als der wilde Ema-Straußenvogel lief das dunkelhaarige junge Mädchen durch den Sertão und die bewaldeten Berghänge von Ipu, wo der kriegerische Stamm der großen Tagajaras, der “Herren der Dörfer”, seine Hütten errichtet hatte. Ihr graziler und bloßer Fuß berührte kaum den grünen Samt, mit dem der erste Tau die Erde überzogen hatte.

Textos de José de Alencar, Iracema, ed. bilíngüe português-alemão.
Seleção de Carlos Almeida.

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