segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

ECOLOGIA INTERIOR

(Frei Betto - "A arte de semear estrelas")

Por um minuto, esquece a poluição do ar e do mar, a química quecontamina a terra e envenena os alimentos, e medita: Como anda o teuequilíbrio ecobiológico?
Tens dialogado com teus órgãos interiores?
Acariciado seu coração?
Respeitas a delicadeza de seu estomago?
Acompanhas mentalmente seu fluxo de sangue?
Teus pensamentos são poluídos?
As palavras, ácidas?Os gestos, agressivos?
Quantos esgotos fétidos correm em tua alma?
Quantos entulhos - mágoas, iras, invejas - se amontoam em teu espírito?
Examina tua mente. Está despoluída de ambições desmedidas, Preguiça intelectual e intenções inconfessáveis?
Teus passos sujam os caminhos de lama, deixando um rastro detristeza e desalento?
Teu humor intoxica-se de raiva e arrogância?
Onde estão as flores do teu bem-querer, os pássaros pousados em teuolhar, as águas cristalinas de tuas palavras?
Por que teu temperamento ferve com freqüência e expele tanta fuligem pelas chaminés de tua intolerância?
Não desperdices a vida queimando a tua língua com as nódoas decomentários infundados sobre a vida alheia.
Preserva o tem ambiente, investe em tua qualidade de vida, purifica oespaço em que transitas.
Limpa os teus olhos das ilusões do poder, fama e riqueza, antes quefiques cego e tenhas os passos desviados para a estrada dessinalizadados rumos da ética. Ela é cheia de buracos e podes enterrar o teucaminho num deles.
Tu és, como eu, um ser frágil, ainda que julgues fortes os semelhantes que merecem a tua reverência.
Somos todos finos copos de cristal quese quebram ao menor atrito: uma palavra descuidada, um gesto quemachuca, uma desconfiança que perdura.
Graças ao Espírito que molda e anima o teu ser, o copo partido sereconstitui, inteiro, se fores capaz de amar. Primeiro, a ti mesmo impedindo que a tua subjetividade se afogue nas marés negativas. Depois, a teus semelhantes, exercendo a tolerância e o perdão, semjamais sacrificar o respeito e a justiça.
Livra a tua vida de tantos lixos acumulados.Atira pela janela as caixas que guardam mágoas e tantas fichas de tuacontabilidade com os supostos débitos de outrem.
Vive cada dia como se fosse a data de teu renascer para o melhor de ti mesmo – e os outros te receberão como dom de amor.Pratica a difícil arte do silêncio.Abandona as preocupações inúteis, as recordações amargas, as inquietações que transcendem o teu poder.
Mergulha no mais íntimo de ti mesmo, em teu oceano de mistério, edescobre, lá no fundo, o SER VIVO que funda a tua identidade.
Guarda este ensinamento: por vezes é preciso fechar os olhos para ver melhor.
Acolhe a tua vida como ela é: Dádiva involuntária. Não pedistes para nascer e, agora, não desejas morrer. Faz dessa gratuidade uma aventura amorosa.
Não sofras por dar valor ao que não merece importância.
Trata a todos como igual, ainda que revestidos ilusoriamente denobreza ou se mostrem carcomidos pela miséria.Faz da justiça o teu modo de ser e jamais te envergonhes de tuapobreza, de tua falta de conhecimentos ou de poder.
Ninguém é maisculto que o outro. O que seria do erudito sem a arte culinária da cozinheira analfabeta?
Tua riqueza e teu poder residem em tua moral edignidade, que não têm preço e te trazem apreço.Porém, arma-te de indignação e esperança.
Luta para que todos oscaminhos sejam aplainados, até que a espécie humana se descubra comouma só família. E cultiva a convicção de que convergimos todos rumo ao supremo Atrator.
Faz de cada segundo de teu existir uma prece. E terás força paraexpulsar os vendilhões do templo, operar milagres e disseminar aternura como plenitude de todos os sentimentos.
Ainda que cercado de adversidades, se preservares a tua ecobiologia interior, serás feliz porque trarás em teu coração tesouros indevassáveis.

Enviado por Ana Passos, Salvador-Ba

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