sexta-feira, 4 de julho de 2008

55. A (des)importância da educação

Prezados amigos,
Meu "recesso", por razões particulares, teve que estender-se por mais uma semana, além das duas previstas. Mas aqui estou de volta. Vejam, por favor, a mensagem no. 55 no anexo.
Muita alegria a todos.

Carlos de Almeida Pereira, Campina Grande/Pb


O milagre da hominização, que ocorreu em nosso planeta, repete-se em cada criança. Mas infelizmente nossas idéias estão bitoladas pelos padrões da sociedade, que levam-nos a ver nossas crianças como produtos que deixamos prontos e acabados num longo processo educativo, e que, caso apresentem falhas, estas seriam resultado de defeitos de produção. Na realidade homem algum é o resultado da educação. Aqui pais e mestres precisam pensar com modéstia. Transcrevemos a seguir o texto de uma palestra proferida por Elisabeth Lukas em um curso para educadores:
Gostaria que as senhoras e os senhores pudessem ter uma idéia de como é grande ou de como é pequena sua participação no desenvolvimento das crianças. Gostaria de motivá-los a serem modestos, a fim de poupar-lhes decepções e libertá-los de falsos complexos de culpa. Se são pai e mãe, puseram sua herança à disposição de seu filho – mas cuidado: Nisto está envolvida mais coisa dos seus ancestrais do que dos senhores mesmos! Se são pai ou mãe, realizaram também grande parte da educação de seus filhos, porém mais uma vez cuidado, as tendências da moda, a escola, os camaradas e os meios de comunicação têm uma parte intensa na educação! Se são pai e mãe, os senhores de fato nada têm a dizer quanto ao potencial de auto-realização do seu filho, o que no máximo há de ficar claro na adolescência.
A relação entre os senhores e seu filho talvez seja bastante sólida para que as duas partes se respeitem com mútua amizade. Mas é possível também que ocorram violentas disputas na família, quando seu filho começar a abandonar o que para ele é conhecido e familiar, e a comportar-se de uma maneira “estranha”. Talvez, como pai e mãe, surjam nos senhores receios de que todos os seus esforços tenham sido em vão, porque seu filho adota um caminho problemático que – não sem razão – não é do seu agrado. Nesse caso apenas se poderá dizer: “Querido papai, querida mamãe, seu filho é carne de sua carne, mas não é espírito do seu espírito. Os senhores o “adotaram” no mundo, e quando ele crescer há de pertencer ao mundo, e não aos senhores. Há de habitar, usar, modificar e enriquecer o mundo com seu espírito, não com o espírito dos senhores. Os senhores, é verdade, ensinaram muitas coisas ao seu filho, mas não esperem que ele fique parado no que aprendeu, nem mesmo que dê valor a isso. Inexoravelmente ele há de seguir seu próprio caminho. Mas os senhores poderão acompanhá-los com seus melhores votos.
Se, pelo contrário, os senhores não são nem pai nem mãe, e sim mestre ou mestra, mãe adotiva ou pai adotivo, madrasta ou padrasto, educadora ou educador, a situação torna-se ainda mais diferente. Nesse caso a criança que lhes foi confiada possui uma herança estranha, que a ela é familiar, mas aos senhores não. Quase sempre ela terá desfrutado também por muito tempo de uma educação que não é a sua, para não falar dos outros fatores de influência ambiental. E no tocante ao seu potencial de auto-realização, os senhores não têm mais direito de intervir do que os pais biológicos, isto é, não têm direito nenhum. Sua única chance de influir pedagogicamente, e sua única responsabilidade, diz respeito ao seu atual convívio com a criança, ao ambiente educativo que podem oferecer-lhe aqui e agora.
Mas também aqui é necessário precaver-se contra qualquer tipo de superproteção. Pois ou a criança confiada aos seus cuidados é ainda jovem, digamos, pré-pubertária, e então ela terá sido fortemente marcada pelo duplo dote de sua origem, que não é a dos senhores, e poderá, quem sabe, apesar de todos os seus esforços ter sido prejudicada. Ou então ela já é mais velha, digamos, pós-pubertária, e então já será capaz de se autoconfigurar, desfazendo suas marcas e adquirindo novas, mas então ela fará isso incluindo também os seus esforços, isto é, não os assumindo sem crítica, mas questionando-os à sua maneira. Nesse caso só poderemos dizer aos senhores: “Querida mãe adotiva, querido pai adotivo, querida professora, querido professor ... Os senhores estão lidando com crianças que não são nem ‘carne de sua carne’ nem espírito do seu espírito. Os senhores nem sequer podem adotar esta criança para o mundo, podem apenas acompanhá-la por uma parte do caminho; e esta etapa comum do caminho, quando muito, se lhe tornará tão familiar quanto os caminhos ou descaminhos que percorreram anteriormente.
Porém mesmo que os senhores tenham escolhido um bom caminho, e mesmo que a criança tenha se sentido bem com ele, um dia ela há de partir para novos caminhos, distantes das trilhas do que lhes é familiar. Não significa isto nenhuma ingratidão pela companhia que os senhores lhe deram por algum tempo, como também não representa nenhum fracasso dos seus esforços, mas simplesmente mostra que a criança – já saída da infância – começa a viver sua vida própria. O que não deve impedir que também nesse caso os senhores a façam acompanhar de seus melhores votos.
Se os senhores acompanharam as perspectivas apresentadas até aqui e entenderam que sua participação no desenvolvimento de suas crianças, sejam elas seus filhos ou não, é relativamente pequena, aos poucos poderão franzir a testa e se interrogar se ainda existe algum sentido para seu trabalho educativo de cada dia. Sob esse aspecto eu posso tranqüilizá-los plenamente. Com base numa modéstia realista é possível se construir uma boa consciência pedagógica.
Sempre de novo se tem enfatizado que educar significa familiarizar, familiarizar com estilo e com hábitos de vida, familiarizar com interpretações de si próprio e do mundo, familiarizar com conhecimentos teóricos e habilidades práticas, e não por último familiarizar com valores éticos e emotivos. Mas não se pode contestar que todo homem, depois de se haver distanciado, sempre pode com facilidade voltar ao que lhe é familiar. Difícil é a ousadia do novo, mas o retorno ao conhecido é simples. Isto significa: quanto mais numerosos e melhores os caminhos de vida com os quais os senhores tiverem familiarizado suas crianças, tanto maiores as chances que elas terão durante toda a vida para retornar aos bons pontos de refúgio e para corrigirem suas rotas, caso necessitem de uma saída e de um retorno. É verdade que, quando adultas, muito provavelmente não irão seguir apenas as rotas preestabelecidas, mas partirão para muitas aventuras. Mas quando for necessário, quando se encontrarem num beco sem saída, elas irão aproveitar-se da orientação que um dia lhes foi transmitida por pessoas que lhes tiveram amizade.
Como são grandes, pelo contrário, as dificuldades daqueles que familiarizaram-se precisamente com coisas que não merecem confiança: os que em sua infância e juventude seguiram trilhas escorregadias, onde os esperava alguma traiçoeira armadilha. Estes não passam pela vida com a confiança primordial de sempre poderem retornar às veredas seguras, mas sim com a radical angústia de que o novo, a aventura, tem que dar certo, porque um retorno os levaria de volta ao atoleiro. A esperança que eles têm é seu potencial de autoconfiguração espiritual, com auxílio do qual podem abrir veredas novas em busca de regiões desconhecidas e talvez aceitáveis. Mas isto exige esforço, exige o entregar-se ao desconhecido, sem terem a possibilidade de voltar ao que lhes é conhecido e familiar. Os senhores percebem que não existe contradição em se afirmar que a educação não produz o homem, ou até mesmo que toda criança é uma personalidade própria que se forma a si própria à medida que evolui. E por outro lado, em destacar a importância de uma educação cuidadosa e dedicada, que consiste exatamente em familiarizar essa pessoa com todos os elementos positivos possíveis, para então confiar se e quando ela irá ou não irá fazer uso disto.



Acabados os dias da festa, quando voltaram, o menino Jesus ficou em Jerusalém, sem que os pais o percebessem. Pensando que estivesse na caravana, andaram o caminho de um dia e o procuraram entre parentes e conhecidos. E não o achando, voltaram a Jerusalém. Três dias depois o encontraram no Templo sentado no meio dos doutores, ouvindo e fazendo perguntas. Todos que o escutavam, maravilharam-se da inteligência e de suas respostas.
Evangelho de Lucas 2,41-47

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