sábado, 2 de fevereiro de 2008

Crítica ao Capitalismo

Dando prosseguimento à mensagem anterior da reflexão franciscana sobre o capitalismo, aqui alguns pontos que podem ajudar-nos a assumir uma posição crítica em relação ao mesmo.

37. Crítica do Capitalismo

A visão negativa do capitalismo (ver a mensagem anterior: 36. Ou Deus ou o dinheiro) não significa que se seja contra uma economia em escala mundial. Pelo contrário, um mercado de que o mundo todo participe é até mesmo um postulado direto da fé cristã e da espiritualidade franciscana: uma economia que não tenha seu núcleo central na acumulação do dinheiro mas sim na promoção da vida. Assim entendida, a economia mundial tem que servir à justiça, à solidariedade universal e à preservação da criação.
A crítica à economia capitalista já se faz ouvir até dos próprios capitalistas. Para o mega-investidor George Soros, a economia de mercado é uma crença com uma ideologia totalitária: uma doutrina que invade e monopoliza todos os setores da vida, semelhante ao comunismo, ao fascismo e a outros sistemas. Um sistema totalitário caracteriza-se pela convicção de conhecer a verdade e de saber distinguir entre o bem e o mal. O totalitarismo im­põe aos outros uma opinião que não pode ser provada – aqui, a fé na força mágica do mercado.
A Igreja Católica tem criticado asperamente o capitalismo desde o século 18. Fica-se espantado ao ver quão pouco esta voz foi ouvida. Até mesmo aqueles que em geral se apóiam no cristianis­mo, os chamados partidos cristãos, mal tomam conhecimento dela. Poderiam ser mencionados inúmeros documentos da Igreja, todos eles merecedores de ser lidos e interpretados mi­nuciosamente, e que vão desde a Encíclica “Rerum Novarum” de Leão XIII (1891) até à “Centesimus Annus” de João Paulo II (1991), passando pela Constituição “Gaudium et Spes” do Concílio Vaticano II e a “Populorum Progressio” de Paulo VI (1967). Todos condenam a doutrina dominante do livre comércio, que favorece apenas o forte, prejudicando o fraco.
É preciso que se chame atenção para um grave equívoco: Muitas fórmulas aplicadas pelos economistas ao capitalismo são provenientes do voca­bulário religioso. As doutrinas do capitalismo são anunciadas como dogmas, suas opiniões apresentadas como promessas, os bens de consumo, inclusive a propaganda, como sacramentos, envolvidos em anseios religiosos. Por isso na América Latina fala-se também de uma "teologia do processo de produção". Para J.K. Galbraith, "assim como se deve acre­ditar em Deus, assim se deve acreditar também no sistema neo­liberal". O progresso técnico é o caminho para o paraíso, e o maior pecado é "a tenta­ção de ser bom", em vez de com humildade se obedecer ao mer­cado e a suas divinas leis.
Frente a esta "teologia" e aos seus ídolos, devemos contra­por, a partir da Bíblia, a voz profética proveniente do verdadei­ro Deus:
O verdadeiro Deus: Adam Smith fala da "mão invisível" que dirige para o bem a economia de mercado. Com isto as estruturas injustas ficam en­volvidas numa auréola quase divina. Mas na realidade "a mão de Deus", tal como a conhecemos a partir da Bíblia, atua de uma forma diferente: Ela liberta das estruturas injustas. Um dos nomes de Deus é Justiça, e só quem está compro­metido com a justiça é que escuta a voz de Deus. Como sistema religioso, o capitalismo é idolatria.
A opção pelos fracos e pelos pobres: O capitalismo ignora que o prin­cípio da seleção foi abolido para a esfera humana. Ao "direito" do forte, a Bíblia con­trapõe o direito do fraco. A opção bíblica pe­los pobres é uma voz que se opõe ao "neodarwinis­mo". Esta opção tem que ser posta em prática também na políti­ca econômica. Deus não está do lado do poder e do dinheiro, Ele se mostra, pelo contrário, o advogado e defensor dos pobres e excluídos.
A cultura da vida: Deus é a vida! Os bens de con­sumo não são tudo, eles não satisfazem às necessidades mais profundas do homem. Quando alguém enxerga o único objetivo de sua vida nas coisas materiais e nos bens de consumo, ele está por assim dizer se alimentando da morte, e há de acabar na mor­te. Quem não faz outra coisa senão consumir, há de ser ele pró­prio consumido! Pode-se ver como a própria economia provoca a morte daqueles a quem ela deveria prover do necessário para a vida. A economia só será útil ao homem quando reconhe­cer e respeitar como prioritárias as necessidades mais profundas do homem, em lugar de as reprimir ou sufocar.
Testemunho profético: No decorrer da história da Igreja surgiram muitas formas de vida que rejeitaram radi­calmente a propriedade privada. A este número pertencem tam­bém Francisco e Clara. Eles entendem a "pobreza" não apenas como o desapegar-se interiormente das coisas, mas pretendem viver "sem propriedade". Para eles, a "apropriação" ou "acumulação" constitui como que o pecado fundamental da humanidade. Por esta razão o hino que Paulo entoa à encarnação de Deus adquire tamanha impor­tância para a forma de vida franciscana. Paulo fala do aniquilamento (cf. Filipenses 2,5), isto é, do "auto-esvazia­mento de Deus", para não ser outra coisa senão um homem en­tre os homens. Com sua radical vida sem propriedade, Francis­co e Clara querem seguir o caminho de Jesus de Nazaré. É aqui, certamente, que se encontra o que de mais autêntico se pode di­zer e esperar do movimento franciscano.
Texto de Anton Rotzetter, Com Deus nos Dias de Hoje, p. 288 ss.
Tradução e adaptação de Carlos Almeida

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