domingo, 24 de abril de 2011

Antecipando o Dia das Mães

Para mim, uma das mulheres mais lúcidas deste País é Danuza Leão, autora dessa crônica publicada hoje no jornal FOLHA DE SÃO PAULO e reproduzido em vários jornais das mais importantes capitais brasileiras. Com idade se aproximando aos 80, seu pensamento continua marcado pela modernidade.

Sérgio Almeida Franco



Leiam com atenção


DANUZA LEÃO

ANTECIPANDO O DIA DAS MÃES

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Quando ele disser que vai viajar, não peça o telefone do hotel e não pergunte que dia ele vai voltar
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Ah, ser mãe é difícil; não existe filho que não tenha dito um dia -ou pelo menos pensado- "ai, não aguento minha mãe", e o pior: com toda razão. Como todas elas gostariam de ser adoradas por seus filhos queridos, existem coisas a serem evitadas. Estou falando de filhos já adultos, claro, pois cabeça de criança é diferente.
Toda mãe tem vontade de telefonar para o filho -e para os dez, se eles forem dez- várias vezes por dia. A primeira de manhã, para saber se está tudo bem e como vai ser o dia dele, isto é, onde vai almoçar, com quem, a que horas etc. E assim como quem não quer nada, se vai sair à noite -para onde, com quem etc. Primeiro conselho: não telefonar de manhã.
Resista também à vontade de telefonar na hora em que você sabe que ele está chegando do trabalho. Coração de mãe é um relógio: sabe sempre. Deixe seu filho em paz, mas esteja sempre à disposição, a qualquer hora do dia ou da noite, para ouvi-lo reclamar do trabalho, da mulher, do filho, e coisas do gênero.
Quando ele disser que vai viajar, não peça, jamais, o telefone do hotel, e não pergunte jamais, mas jamais, que dia ele vai voltar; se não resistiu e perguntou, se segure, corte o fio do telefone, ateie fogo às vestes, faça qualquer coisa, mas não telefone para ele na manhã desse dia. Faça assim: quando ele ligar, finja surpresa e pergunte, como quem não quer nada: "mas você não ia chegar na semana que vem?" Vai ser um alívio ele saber que você não passa a vida só pensando nele.
Mãe, acalme-se; já que você adora tanto seus filhos, seja boa mãe, e não dê palpite sobre nada, a não ser quando consultada, e mesmo assim, cuidado com o que vai dizer. Se ele se queixar da mulher, não aproveite a chance para dizer tudo o que está atravessado na sua garganta. Fique quieta, calada, porque eles vão fazer as pazes -que é o que você deveria almejar- e vai acabar sobrando pra você.
Tem hora pra tudo, inclusive -e principalmente- pra mãe.
É claro que ele te adora, se não fosse você, ele não existiria etc., mas dê um tempo: ninguém suporta ser tão fundamental à felicidade do outro, como as mães costumam deixar sempre tão claro. É verdade, mas nem todas as verdades precisam ser ditas.
Quer saber o que é uma mãe confortável? É aquela que tem vida própria; ou porque joga pôquer e ninguém vai tirá-la da rodinha de sábado, ou porque tem um namorado e por isso não vai poder cuidar dos netos, ou porque é viciada em shoppings, qualquer coisa. É aquela que não diz, jamais, "eu avisei".
É claro que eles vão reclamar que não contam com você para nada, que você é egoísta e imprestável, mas se pudessem escolher entre uma mãe que sufoca de tanto amor, e a outra, que vive e deixa viver, sabe qual ele ia preferir?
Goste dele mais que tudo neste mundo, mas não diga nada -nem com palavras, e muito menos com o olhar. E não fique triste ao constatar que ele se importa muito mais com seus próprios filhos do que com você: a vida é assim mesmo, e o amor de cima para baixo -de mãe para filho- é muito maior do que aquele de baixo para cima -de filho para mãe.
Ele também vai ficar triste quando, já avô, perceber que seus filhos gostam muito mais de seus próprios filhos do que dele, e vai entender que isso é natural.
Nem bom nem ruim, nem justo nem injusto: apenas é.

danuza.leao@uol.com.br

Fonte : Folha de São Paulo


Biografia

DANUZA LEÃO nasceu em Itaguaçu em 26 de julho de 1933, no Espírito Santo, e aos dez anos foi para o Rio de Janeiro. Depois de exercer atividades variadas, tornou-se jornalista. Suas crônicas encontram-se reunidas em Danuza todo dia, Crônicas para guardar e As aparências enganam. Seu maior sucesso foi o livro de etiqueta Na sala com Danuza (1992), que liderou a lista dos mais vendidos durante um ano, e teve uma edição revista, Na sala com Danuza 2, em 2004 e uma edição de bolso pela Companhia das Letras em 2007. Também pela Companhia das Letras publicou seu livro de memórias, Quase tudo (2005), que já vendeu quase 130.000 exemplares. Irmã da cantora Nara Leão, foi casada com o jornalista Samuel Wainer, fundador do extinto jornal Última Hora. É mãe da artista plástica Pinky Wainer, do jornalista, já falecido, Samuel Wainer Filho e de Bruno Wainer, empresário do ramo de distribuição cinematográfica.

8 comentários:

vera lúcia Pinheiro disse...

É verdade que um amor com superproteção pode sufocar e irritar os filhos, mas,hoje como se pode viver em paz com tanta violência? Como não querer saber onde está um filho, a que horas vai chegar,com quem?
Como conseguir durmir em paz sabendo que o filho está na rua tarde da noite?
Não é tão fácil amar sem cuidar, sem querer proteger o tempo todo, nos dias de hoje.

Vera

Anônimo disse...

Dizia Santo Agostinho que se dois grandes amigos tiverem opiniões diferentes, não se envolva, porque pode perder um amigo.
Quero dizer que hoje é dificil ser pai ou avô. Principalmente agora com a aproximasção da chegada do OXI (de oxidação). É pior do que o crack, mais barato, vicia mais rapido e os danos ao organismo são bem maiores.
No processo de produção é substituido o bicarbonato e amoniaco por querosene e cal virgem.
Sem outros comentarios que poderiam ser feitos.Arlindo

Anônimo disse...

Desculpem: escrevi aproximação de maneira incorreta.
Não costumo reler o que escrevo, como fiz agora, portanto devo ter errado muito antes. Arlindo

Sérgio Almeida Franco disse...

Prestem atenção que o foco a que Danuza se refere diz respeito a filhos adultos e que por assim serem já devem estar com a personalidade formada e o caráter definido. Assim, a super proteção, seja de uma mãe ou outra pessoa, não fará mais do que irritá-lo.
Pensem nisso.

Anônimo disse...

Vejam como os comentários são importantes, esclarecedores e deveriam se repetir com com mais frequência. Não há vencido nem vencedor, todos saem ganhando.
Arlindo

Vera disse...

Compreendí o foco da Autora perfeitamente e entendo seu ponto de vista. Não fui mãe, talvez não serei, mas tive a oportunidade de ser irmãe, ou seja, uma irmã que praticamente é mãe de seu irmão, e posso garantir que quando adulto é ainda mais difícil, não temos controle, nem pulso para determinar certas atitudes. Sei que a super proteção pode irritar, mas no período em que vivemos qdo um filho está mundo a fora não sussegamos enquanto não temos a certeza de que estão seguros. Eu sou uma mulher adulta e qdo viajo a primeira coisa que tenho que fazer quando chego no meu destino é ligar para meus pais e dizer que já estou no Hotel, segura e em paz.
Vera

Anônimo disse...

É isso mesmo Sérgio. Adorei a crõnica da Danuza e concordo com ela.Sem cobranças, eles ficam mais perto e são sempre mais atenciosos.A crõnica trata do relacionamento com os filhos adultos e é justamente, nessa fase que as mães devem investir "sem economizar" na suavidade e delicadezada, extensiva a noras e netos.A paz, reinará para sempre...a Danuza tem toda razão. Josélia

Sérgio Almeida Franco disse...

É isso, Josélia,

Tal qual Danuza, seu pensamento continua afiado,

Uma boa semana para todos.