sexta-feira, 26 de outubro de 2007

Essência do Cristianismo




Nesses dias em que o teólogo e escritor Hans Küng encontra-se no Brasil, nada melhor do que saber qual é para ele a ESSÊNCIA DO CRISTIANISMO.

Veja no anexo a mensagem número 22.

Carlos Almeida

carlostrad@uol.com.br
Skype: carlostrad

26.10.2007

O livro SPURENSUCHE, de Hans Küng, surgiu como subproduto de um trabalho em escala mundial para uma série televisiva de um dos canais de TV da Alemanha. A palavra-título tem o significado literal de “investigação” ou “busca dos vestígios”. No Brasil, o livro (por mim traduzido) foi publicado pela Verus Editora, de Campinas, SP, com o título “RELIGIÕES DO MUNDO. Em busca dos pontos comuns”. Além das religiões tribais (dos aborígines da Austrália), ocupa-se com o hinduísmo, a religião chinesa, budismo, judaísmo, cristianismo e islamismo. Representa a grande contribuição do autor para o conhecimento mútuo, e por conseguinte para o diálogo entre as religiões. Numa apresentação rápida e isolada como na presente mensagem, não há como ocupar-nos com outra coisa que não com a “nossa” religião: o cristianismo.

22. A Essência do Cristianismo

A ESSÊNCIA DO CRISTIANISMO não é, como muitos pensam, uma grande teoria, nem uma visão do mundo ou um sistema de igreja. É pura e simplesmente a pessoa de Jesus Cristo. Cristão é todo aquele que, em sua caminhada pessoal tenta se orientar por Jesus Cristo. No fundo, nenhuma organização, nenhuma instituição e nem mesmo nenhuma igreja deverá honestamen­te chamar-se cristã se não puder tomar como referência a pessoa de Jesus Cristo.

CRISTÃOS ENGAJADOS - Em 1989, em San Salvador, seis padres meus amigos foram brutalmente massacrados por um esquadrão da morte, na casa da Universidade Centro-Americana, onde dois anos antes eu estivera hospedado. Desde décadas eles dedicavam-se aos mais pobres dos pobres – segundo a Bíblia, os prediletos de Deus. Ne­nhum deles queria ser mártir, nenhum era asceta, todos eram pes­soas normais. Mas eram cristãos engajados: o espírito de Jesus estava vivo em todos eles. E em muitos outros, que à sua maneira são membros engajados do cristianismo, testemu­nhas de uma fé pela qual o pr6prio Jesus se guiava: o doutor das selvas Albert Schweitzer, o secretário geral da ONU Dag Hammarskjõld, o papa João XXIII, o patriarca Atenágoras, dom Hélder Câmara, o arcebispo Desmond Tutu, madre Teresa de Calcutá, o abade Pierre... O que os une a todos é o fato de deixarem-se orientar pela figura humana concreta de Jesus.

REFLEXÃO NECESSÁRIA - Por isso é necessário refletir constantemente sobre a figura original de Jesus Cristo. É ele, e não qualquer autoridade do Estado ou da Igreja, que é o critério do ser-cristão. O que importa é a presença viva de Jesus Cristo, como origem, fundamento e centro. O que importa na mensa­gem de Jesus é a alegre mensagem de uma nova liberdade: não se deixar dominar pelo desejo do dinheiro e do prestígio, pela ânsia do poder, pelo instinto do sexo ou pela busca do prazer e do gozo, mas tornar-se livre para Deus e para os semelhantes. Não deve o homem, para isso, se transformar num asceta; Jesus, como se sabe, também tomou parte em banquetes. Mas o homem também não deve satisfazer de maneira egoísta seus próprios interesses e necessidades. O que importa é que, em vista do reino de Deus, ele viva segundo a vontade de Deus e leve em conta o bem do próximo: não querer dominar sobre o outro, mas procurar servir.

A CHEGADA DO REINO DE DEUS - Jesus não anunciou nenhum estado teocrático, nem a ins­tituição de uma igreja, mas sim a chegada do reino de Deus, com suas promessas e exigências. Porém sua mensagem e sua prática levaram a um conflito de vida e morte com o establishment político-religioso. Por demais radical sua crítica à religiosidade tradicional e à prática do poder pelos poderosos; por demais liberal sua convivência com a lei religiosa e com as regulamentações referentes ao sábado, à pureza e aos alimentos; por demais escandalosa sua solidariedade com os pobres, com os miseráveis, com os "pobres diabos": ele tem compaixão do povo. Para escândalo dos piedosos, ele demonstra por demais compreensão com os que ofen­dem a lei, os "pecadores".

O TERRÍVEL FIM é por todos conhecido: ele morreu jovem, com cerca de trinta anos, depois de uma atuação espantosamente breve. Traído e negado por seus discípulos e adeptos. Escarnecido e ridicularizado por seus adversários, aban­donado por Deus e pelos homens. Uma morte cruel, que a jurisprudência romana não permitia que fosse aplicada a cidadãos romanos. Desde então a cruz é o sinal do cristão. E é a cruz que torna possível ao cristão superar mesmo o que é negativo na vida do homem e na sociedade: sofri­mento, culpa, insensatez e morte.

SINAL DE SALVAÇÃO - Como pôde o escândalo da cruz vir a ser sinal de salvação para os primeiros que acreditaram em Jesus? Pois é um fato que logo eles passaram a ver a cruz sob uma luz inteiramente diferente. Por quê? Com base em determinadas experiências, visões, "aparições", e também em certos padrões de interpretação da Bíblia Hebraica, eles chegaram a esta convicção: Jesus não permaneceu na morte, mas foi despertado por Deus para a vida eterna, acolhido na glória de Deus.

CONSTITUÍDO FILHO DE DEUS - Já enquanto viveu, alguns viram nele o Messias. Quaisquer que sejam, no entanto, os numerosos títulos, ele próprio é e continua a ser desde então a encarnação viva de sua causa. Para os cristãos surgiu com ele o reino de Deus. Os cristãos confiam nele e em seu caminho. O Crucificado é o grande sinal de esperança numa vida eterna, como se diz na Epístola aos Romanos (1,4): “Constituído Filho de Deus no poder, a partir da ressurreição dos mortos”.

Texto baseado em Hans Küng, Religiões do Mundo, p. 214 ss.

Tradução e adaptação de Carlos Almeida , Campina Grande/Pb

Um comentário:

Anônimo disse...

Senhores

Quem produziu a série de televisão com Hans Küng? Gostaria muito de conseguir uma cópia do trabalho sobre judaismo. Voc~es t~em alguma "dica"? Obrigado por qualquer informação.

juliowohlgemuth@bol.com.br