Em torno de nove da manhã do dia 08 dezembro de 1.978, estava eu no trabalho na Goodyear em São Paulo, quando recebo um telefonema de Fortaleza. No outro lado da linha, Heloísa Helena, sobrinha da Itacoeli e hoje freqüente colaboradora deste Blog. Parecia aquela estória “o seu gato subiu no telhado”.
- Sérgio, caiu um avião em Recife e acho que nele tinha um irmão seu.
Dos irmãos, José Almar, o mais velho, era o que mais viajava. Naquela ocasião, ele era Diretor da SUDENE, cuja sede nacional funcionou na capital pernambucana. Coincidentemente, o escritório da SUDENE em São Paulo ficava nas “biqueiras” de meu apartamento. Era só olhar pela janela que se enxergava na Avenida Angélica, no bairro de Higienópolis, o escritório paulista daquela então importante autarquia criada por Celso Furtado, no Governo JK.
Do trabalho, liguei para a Itacoeli e falei para ela o que a Heloísa havia me dito. Orientei-lhe que pegasse o elevador e fosse ao Escritório da SUDENE junto de nossa casa e procurasse a confirmação dessa notícia diretamente do seu Diretor, que se chamava Lincoln. Nesse ínterim, avisei ao Lincoln que minha mulher estaria chegando em seu escritório em instantes e lhe falei o motivo. Como era feriado em Recife, Lincoln, até então, de nada sabia.
Alguns minutos após, recebo de Lincoln um telefonema.
-É, Sérgio, as notícias não são boas.
– Já entendi.
Lincoln, que, nesse momento estava recebendo em sua sala a Itacoeli, completou ao telefone.
-Ontem, no início da noite, um avião bimotor pertencente ao DNOCS decolou do Aeroporto de Guararapes com destino a Fortaleza e sequer chegou a se comunicar com a torre. Caiu no mar de Boa Viagem, com cinco ocupantes, a poucos quilômetros da praia. Não houve sobreviventes. A ironia do destino foi maior porque ele estava de passagem comprada para ir para Fortaleza no võo 108 da companhia aérea Cruzeiro do Sul, mas aproveitou uma carona nesse avião pequeno que saía em horário mais adequado ao seu interesse.
Fausto, nosso caçula, havia nascido há dois meses no Hospital Alvorada no bairro de Moema na capital paulista. Mamãe tinha ido para São Paulo justamente para dar o necessário apoio a Itacoeli. Mas nesse exato dia, quando Fausto, com dois meses, e a mãe já não exigiam tantos cuidados, mamãe tinha viajado para o Rio visitar seus sobrinhos cariocas, no caso Déa, Dulce, Dora, Darcy, Dion e Dilson, filhos de seu irmão José (já falecido na época) e Tia Teresinha.
Minha preocupação passou a ser como dar essa notícia à mamãe. Mas ela já tinha sido avisada não seu bem por quem. Porém, faltava-lhe aquela confirmação que coube a mim lhe dar.
Providenciei a compra da minha passagem de São Paulo para Fortaleza num võo que fizesse escala no Rio com o intuito de chegar em Fortaleza junto com a mamãe. Nessa época, ainda não existia o Aeroporto de Guarulhos. O võo 160 da VASP com escalas no Rio, Salvador, Recife, Natal e Fortaleza, saindo de Congonhas às 18:00 horas, tinha previsão de pousar em Fortaleza logo após a meia noite.
O avião atrasou muito, antecipando o que décadas depois seria chamado de “apagão aéreo” . A decolagem somente ocorreu após a meia noite quando já deveríamos estar chegando em Fortaleza.
No sala de embarque encontro um grande amigo que estava indo para o Rio no mesmo võo que eu para Fortaleza. Chamava-se Hermano e trabalhava em um escritório de planejamento que prestou serviços para a empresa onde trabalhei. Ele era um ótimo papo, o que não me fez sentir tanto o atraso aéreo exagerado pelo qual passei naquele momento tão difícil. Além de ser uma ótima pessoa, Hermano era casado com a cantora Cristina Buarque, uma das irmãs do Chico.
Por volta das 8 da noite, Cid Moreira no Jornal Nacional noticiou que um acidente aéreo grave tinha ocorrido na noite anterior em Recife, sem sobreviventes. Aí, fiz meu comentário para o amigo que havia surgido em hora tão oportuna:
- Hermano, essa viagem que estou fazendo a Fortaleza é para enterrar um irmão vítima desse desastre.
A partir daí, demorou um pouco para que nossa conversa engrenasse novamente. Era um tempo de forte ebulição política em pleno regime militar e Hermano me confidenciou que estava indo ao Rio participar da organização de um movimento de resistência que incluía várias ações, entre as quais um show que iria se realizar meses depois no Rio Centro, no primeiro de maio seguinte.
Do trabalho, liguei para a Itacoeli e falei para ela o que a Heloísa havia me dito. Orientei-lhe que pegasse o elevador e fosse ao Escritório da SUDENE junto de nossa casa e procurasse a confirmação dessa notícia diretamente do seu Diretor, que se chamava Lincoln. Nesse ínterim, avisei ao Lincoln que minha mulher estaria chegando em seu escritório em instantes e lhe falei o motivo. Como era feriado em Recife, Lincoln, até então, de nada sabia.
Alguns minutos após, recebo de Lincoln um telefonema.
-É, Sérgio, as notícias não são boas.
– Já entendi.
Lincoln, que, nesse momento estava recebendo em sua sala a Itacoeli, completou ao telefone.
-Ontem, no início da noite, um avião bimotor pertencente ao DNOCS decolou do Aeroporto de Guararapes com destino a Fortaleza e sequer chegou a se comunicar com a torre. Caiu no mar de Boa Viagem, com cinco ocupantes, a poucos quilômetros da praia. Não houve sobreviventes. A ironia do destino foi maior porque ele estava de passagem comprada para ir para Fortaleza no võo 108 da companhia aérea Cruzeiro do Sul, mas aproveitou uma carona nesse avião pequeno que saía em horário mais adequado ao seu interesse.
Fausto, nosso caçula, havia nascido há dois meses no Hospital Alvorada no bairro de Moema na capital paulista. Mamãe tinha ido para São Paulo justamente para dar o necessário apoio a Itacoeli. Mas nesse exato dia, quando Fausto, com dois meses, e a mãe já não exigiam tantos cuidados, mamãe tinha viajado para o Rio visitar seus sobrinhos cariocas, no caso Déa, Dulce, Dora, Darcy, Dion e Dilson, filhos de seu irmão José (já falecido na época) e Tia Teresinha.
Minha preocupação passou a ser como dar essa notícia à mamãe. Mas ela já tinha sido avisada não seu bem por quem. Porém, faltava-lhe aquela confirmação que coube a mim lhe dar.
Providenciei a compra da minha passagem de São Paulo para Fortaleza num võo que fizesse escala no Rio com o intuito de chegar em Fortaleza junto com a mamãe. Nessa época, ainda não existia o Aeroporto de Guarulhos. O võo 160 da VASP com escalas no Rio, Salvador, Recife, Natal e Fortaleza, saindo de Congonhas às 18:00 horas, tinha previsão de pousar em Fortaleza logo após a meia noite.
O avião atrasou muito, antecipando o que décadas depois seria chamado de “apagão aéreo” . A decolagem somente ocorreu após a meia noite quando já deveríamos estar chegando em Fortaleza.
No sala de embarque encontro um grande amigo que estava indo para o Rio no mesmo võo que eu para Fortaleza. Chamava-se Hermano e trabalhava em um escritório de planejamento que prestou serviços para a empresa onde trabalhei. Ele era um ótimo papo, o que não me fez sentir tanto o atraso aéreo exagerado pelo qual passei naquele momento tão difícil. Além de ser uma ótima pessoa, Hermano era casado com a cantora Cristina Buarque, uma das irmãs do Chico.
Por volta das 8 da noite, Cid Moreira no Jornal Nacional noticiou que um acidente aéreo grave tinha ocorrido na noite anterior em Recife, sem sobreviventes. Aí, fiz meu comentário para o amigo que havia surgido em hora tão oportuna:
- Hermano, essa viagem que estou fazendo a Fortaleza é para enterrar um irmão vítima desse desastre.
A partir daí, demorou um pouco para que nossa conversa engrenasse novamente. Era um tempo de forte ebulição política em pleno regime militar e Hermano me confidenciou que estava indo ao Rio participar da organização de um movimento de resistência que incluía várias ações, entre as quais um show que iria se realizar meses depois no Rio Centro, no primeiro de maio seguinte.
Nesse show ocorreu um “acidente de trabalho” com dois militares que estavam em um carro e uma bomba no colo de um deles causou-lhe a morte. Foi o famoso episódio do Rio Centro, que entrou para a história contemporânea do Brasil. Depois desse dia, jamais voltei encontrar aquele amigo. Soube por amizades paulistas que alguns anos depois, ele se separou da irmã do Chico.
O avião pousou no Rio já depois de uma hora da madrugada. Hermano se despediu de mim e desceu no Aeroporto do Galeão, que era seu destino. Permaneci em minha cadeira e minutos depois, pelo alto falante do avião, fui chamado a me apresentar a um dos comissários de bordo na porta dianteira da aeronave. Era para receber mamãe que, inconsolável, acompanhada por Roberto, nessa época casado com minha prima Dora, a deixou sob meus cuidados.
Encontrei não sei exatamente onde forças para consolar mamãe até Fortaleza nesse võo que chegou à capital cearense já com sol forte.
Do aeroporto, fomos diretamente para o Cemitério Parque da Paz onde também ocorreu o velório. Parece que Fortaleza inteira estava lá. Afinal, todas as vítimas eram cearenses e todos bastante conhecidos na sociedade.
Após o sepultamento, fomos para a casa da Aleuda, onde estava lá, além dos de casa, o Tio Carlos. Foi aí que pra mim a “ficha caiu”. Depois de tanta emoção, eu, aos prantos, gritei com toda a força que meus pulmões assim o permitiram :
- NÃO É UM PESADELO ?
O avião pousou no Rio já depois de uma hora da madrugada. Hermano se despediu de mim e desceu no Aeroporto do Galeão, que era seu destino. Permaneci em minha cadeira e minutos depois, pelo alto falante do avião, fui chamado a me apresentar a um dos comissários de bordo na porta dianteira da aeronave. Era para receber mamãe que, inconsolável, acompanhada por Roberto, nessa época casado com minha prima Dora, a deixou sob meus cuidados.
Encontrei não sei exatamente onde forças para consolar mamãe até Fortaleza nesse võo que chegou à capital cearense já com sol forte.
Do aeroporto, fomos diretamente para o Cemitério Parque da Paz onde também ocorreu o velório. Parece que Fortaleza inteira estava lá. Afinal, todas as vítimas eram cearenses e todos bastante conhecidos na sociedade.
Após o sepultamento, fomos para a casa da Aleuda, onde estava lá, além dos de casa, o Tio Carlos. Foi aí que pra mim a “ficha caiu”. Depois de tanta emoção, eu, aos prantos, gritei com toda a força que meus pulmões assim o permitiram :
- NÃO É UM PESADELO ?
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José Almar era o mais velho dos irmãos. Engenheiro Agrônomo, funcionário graduado do Banco do Nordeste, foi Diretor da SUDENE. Era dotado de uma inteligência rara. Gostava muito de música, sendo clarinetista do Conjunto Universitário que animava as tertúlias (é o novo!) do CEU (Clube dos Estudantes Universitários) e de outros clubes da cidade. Nesse Conjunto também tocavam os irmãos Afrodísio e Carlito Pamplona. O cantor era Maurício Benevides, médico, irmão do ex-Senador Mauro Benevides.
Sei da existência no Colégio Cearense (Marista), onde ele estudou, de uma placa em sua homenagem por ele ter tirado dez em todas as matérias nos exames finais de um determinado ano. Cheguei a ler há alguns anos uma notinha sobre esse fato no Jornal O POVO.
Almar deixou a mulher, Sizinha, e um filho, Paulo César, hoje advogado em Fortaleza e Procurador da Prefeitura de Cascavel.
Nessa viagem, permaneci em Fortaleza até o dia da Missa de Sétimo Dia, a qual foi celebrada na Igreja de Fátima completamente lotada.
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Vale lembrar que foi também em 08 de dezembro de anos distintos que John Lenon e Tom Jobim partiram.
Sérgio Almeida Franco, Salvador/Ba
2 comentários:
Querido Primo Sérgio:
Fiquei emocionada ao ler o seu relato! De certa forma me envolvi com aquele triste episódio através do sofrimento de tia Beatriz. Aquele dia está gravado
em minha recordação.
Fiquei feliz de conhecer algo tão positivo a respeito do primo José Almar.
Aprendi que as pessoas só morrem definitivamente quando deixam de ser recordadas. Assim, José Almar continua vivendo em nossas próprias vidas.
Um abraço afetuoso da prima que o admira e respeita, Déa.
Puxa vida, o comentário a mim causou uma tremenda regressão. A figura mansa e calma do Zeomar me veio fortemente na lembrança. Uma boa recordação. Beijos para todos, do primo irmão, Arnaldo Almeida
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