A sigla nos daria o mais breve título para um grande livro – pelo menos antes de ser decifrada. O livro, no entanto, é o mais volumoso – e talvez o mais importante – de todos para os quais tive oportunidade de colaborar. 3 grossos volumes tamanho 20x28 cm, um total de 2700 páginas em coluna dupla, altura total de 17 cm quando colocados um sobre o outro os três volumes. Um livro que de agora em diante não poderá faltar em nenhuma biblioteca que se preze. Publicado nesse final de ano pela Editora Contraponto, Rio de Janeiro - contrapontoeditora@gmail.com -, sob a competente coordenação de César Benjamin, o “Dicionário de Biografias Científicas”, ou DSB (Dictionary of Scientific Biography), como é intitulado o original americano, está com certeza destinado a marcar época na literatura científica dos países de língua portuguesa. A tradução portuguesa apresenta as biografias de 329 personalidades que deixaram suas marcas na história das ciências – desde a Antigüidade grega até os tempos atuais. Para orgulho nosso, dois brasileiros se encontram aí incluídos, Osvaldo Cruz e Carlos Chagas.
Na lista dos tradutores que contribuíram para a edição portuguesa eu figuro em segundo lugar (na ordem alfabética), com 33 biografias. Entre elas, as de Ampère, Bohr, Boltzmann, Born, Clausius, Compton, Dirac, Einstein, Heisenberg, Hubble, Lorentz, Maxwell, Ohm, Pauli, Röntgen, Rutherford, Schrödinger, Volta. Todos eles nomes de peso na construção da nova Física e da nova Astronomia.
Se me for permitido pagar mais um tributo à minha vaidade, transcreverei aqui os termos que o editor César Benjamin achou por bem incluir entre os agradecimentos: “Carlos Almeida Pereira pôs à nossa disposição, durante todo o tempo, seus vastos conhecimentos de latim e alemão.“ A seguir, parte da Introdução escrita por César Benjamin:
A história da ciência é essencial para se compreender a ciência. Pois todos os problemas têm uma gênese e passam por sucessivas formulações, que os moldam e os modificam. (...) Nosso ensino de ciências, em geral, não consegue transmitir o fascínio dessa caminhada. Tudo se banaliza. Problemas que exigiram esforço gigantesco, durante séculos – às vezes durante bem mais de mil anos, como por exemplo, o problema do movimento da Terra – são apresentados em salas de aula em forma acabada, como coisa simplesmente dada, algo que é assim, e ponto final. Os estudantes não têm a possibilidade de conhecer a construção e o sentido original das questões, de compreender as dificuldades enfrentadas, de solucioná-las, de acompanhar como e por que as próprias perguntas se alteraram, para então conhecer a grandeza das soluções encontradas e visualizar os desafios que permanecem em aberto.
Apresentada sem história, a ciência não apaixona. Pois a história é que contém boa parte da beleza – eu poderia dizer, da estética – da ciência, que deve ser considerada uma parte da grande aventura da existência humana, uma das vias necessárias para compreendermos o mundo e nós mesmos. Essa história decorre em variadas escalas de observação, exige diferentes ferramentas de análise e se debruça sobre os mais diversos objetos, grandiosos ou pequeninos, visíveis ou invisíveis, materiais ou ideais, vivos ou inanimados.
Quem não se curva diante da imponência das realizações astronômicas e geográficas de Ptolomeu, mesmo tendo cometido o erro de colocar a Terra no centro do universo? Quem não se surpreende com o amplo e minucioso sistema de classificação dos três reinos da natureza – o mineral, o vegetal e o animal – concebido por Linnaeus? Quem não se impressiona com a ousadia de Mendeleev, ao propor a tabela periódica de todos os elementos químicos, muitos dos quais ainda não tinham sido descobertos? Quem não se emociona ao acompanhar a decifração, por Karl von Frisch, da delicada dança das abelhas, realizada na intimidade das colméias, para comunicar, umas às outras, a exata localização do alimento em campos e florestas, a centenas de metros? Quem não perde o fôlego diante da aventura intelectual que foi a criação de duas novas teorias físicas, nas primeiras décadas do século XX, uma para responder aos desafios vindos do mundo dos átomos, a outra para compreender o macrocosmo?
Tamanha aventura não se deixa aprisionar em um caminho único. Certos problemas são visualizados e as soluções são perseguidas durante séculos; diversos pensadores se aproximam delas, avançam, chegam perto das respostas, mas não conseguem dar o salto, até que alguém encontra a exata formulação que faltava. É o caso, por exemplo, da invenção do cálculo, realizada de forma independente por Newton e Leibniz, no século XVIII, depois de esforços de gerações sucessivas. Passamos a contar, finalmente, com uma ferramenta matemática capaz de modelar o movimento, no espaço e no tempo, e de determinar a área de figuras irregulares. (...)
O Dicionário permite mil leituras diferentes. Certos pensadores esbarram em descobertas e em novas questões, mas não as reconhecem plenamente. Às vezes não dispõem dos novos conceitos que serão necessários para descrevê-las e compreendê-las. Priestley isolou o oxigênio, mas foi Lavoisier quem descobriu a importâa import foi Lavoisier quem descobriuos pensadores esbarram em descobertas e em novas questncia da descoberta. Saccheri esteve perto das geometrias não-euclidianas, Kepler esteve perto da gravitação. Meyer esteve perto da tabela periódica, Poincaré esteve perto da relatividade, mas nenhum deles as formulou. (...)
Talvez o mais importante subproduto de uma leitura atenta do Dicionário (...) seja a clara percepção de que muito do que se diz em história da ciência, como, de resto, em outras áreas, é apenas simplificação. O pensamento científico, como qualquer empreendimento complexo, decorre de um formidável esforço coletivo, estendido no tempo, múltiplo, cheio de idas e vindas, muitas vezes surpreendente, que não se deixa capturar por nenhum esquema fixo, formulado com ligeireza. A própria noção de uma Revolução Científica realizada em um momento específico, mais ou menos entre os séculos XVII e XVIII, embora útil sob certos pontos de vista, deve ser considerada com cautela. As idéias fundamentais aparecem diversas vezes na história e amadurecem longamente. Não há começos absolutos para quem está imerso na História. Copérnico, personagem tão representativo da aurora da Revolução Científica, foi fortemente influenciado pelos astrônomos árabes que o antecederam, e o heliocentrismo, que propôs, já era uma idéia presente, com força, entre os gregos antigos. (...)
Texto de César Benjamin, na Introdução ao Dicionário de Biografias Científicas
Enviado por Carlos Almeida Pereira, Campina Grande/Pb
domingo, 30 de dezembro de 2007
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