Opção pelos Pobres
“Os pobres se tornam cada vez mais pobres, os ricos cada vez mais ricos.” Esta é uma frase que sempre de novo podemos ouvir. E não sem razão:
· Homens, mulheres e crianças são explorados. 300 milhões de crianças são obrigadas a trabalhar em condições brutais.
· A criação está sendo explorada. As grandes em presas lucram com os tesouros da natureza, que no entanto pertencem a todos.
· No mundo são produzidos 10% mais alimentos do que o necessário. Não obstante, todo ano 30 milhões de pessoas morrem de fome, e 800 milhões sofrem de desnutrição.
E por aí vai.
O que o Concílio Vaticano II constatou há quase 50 anos ainda continua a ser verdade: "Enquanto enorme multidão tem falta ainda de coisas absolutamente necessárias, alguns, mesmo em regiões menos desenvolvidas, vivem na opulência ou esperdiçam os bens. O luxo e a miséria existem simultaneamente" (GS 63).
Os pobres na Bíblia - Diante da espantosa pobreza no mundo, precisamos voltar a ler a Sagrada Escritura. Os pobres no Antigo Testamento são pessoas que precisam de ajuda e que lutam até mesmo pela própria sobrevivência. Eles não têm o que é necessário para inspirar respeito. Por isso são desprezados. Podem ser encontradas duas concepções opostas:
(1) A riqueza material e a saúde são sinais certos da bênção de Deus: portanto, pobreza e doença são sinais de sua maldição. Esta opinião persiste em muitas pessoas até hoje.
(2) Contra esta concepção volta-se a tradição dos profetas: Os pobres são os prediletos de Deus: Deus se envolve com eles incondicionalmente. "Ele terá compaixão do miserável e do pobre e salvará a vida dos indigentes" (Salmo 72,13). Os pobres não podem esperar auxílio dos outros. Sua única esperança é Deus. Por isso eles são chamados os anawim yahwe, os pobres de Deus (cf. o "Magnificat" e as "Bem-aventuranças").
Jesus e os pobres - No tempo de Jesus, Israel era uma colônia dominada pelos romanos, que determinavam toda a vida social e econômica. Havia os que tiravam vantagem e os que eram explorados. Além disso, dentro do próprio povo judeu existia a sociedade de classes: os sumos sacerdotes, o conselho dos anciãos e escribas, de um lado. Os pobres, oprimidos e ignorantes, os anawim, do outro. Foi a estes que Jesus se dedicou de maneira especial.
O próprio Jesus era um homem do povo pobre, da desprezada Galiléia, de Nazaré, de onde na opinião dos chefes em Jerusalém não podia sair nada de bom. Jesus viu que este povo era como um rebanho sem pastor, e fez-se para ele o "bom pastor" (Jo 10,11-21), em quem os pobres e os pequenos começaram a depositar esperança.
O Evangelho de Lucas coloca nos lábios de Maria o cântico daquela esperança que irrompe com Jesus: Ele derruba os poderosos de seus tronos, exalta os humildes, dá de comer aos famintos e deixa os ricos de mãos vazias. O velho Simeão vê em Jesus um sinal de que hão de levantar-se os que agora estão caídos por terra, e de que hão de cair os que agora se encontram no esplendor.
No início de sua vida pública o próprio Jesus explica o sentido de sua vida. Na sinagoga de Nazaré ele leu esse trecho do profeta Isaías: “O Espírito do Senhor está sobre mim, porque Ele me ungiu para evangelizar os pobres, enviou-me para anunciar aos aprisionados a libertação, aos cegos a recuperação da vista, para pôr em liberdade os oprimidos, e para anunciar um ano de graça do Senhor”. E disse: “Hoje se cumpriu o que acabais de ouvir'. Não é outra coisa o que conta o Evangelho de Lucas: Jesus se põe coerentemente a favor dos pobres, dos fracos, das vítimas, dos excluídos. No fim ele terá que pagar com a vida esta ousadia.
Também os outros evangelhos contam mais ou menos a mesma coisa. Jesus é apresentado como um homem que não tem onde reclinar a cabeça e que vive numa constante solidariedade com os pobres. Quem quiser segui-lo terá que renunciar a toda idéia de posse e procurar com Ele a comunhão com os pobres (cf. o cap. 10 de Marcos). Pois os pobres, os que choram, os fracos, os perseguidos e espoliados devem experimentar e saber que "deles é o Reino de Deus", a consolação, a vida, a justiça, o país, a terra inteira (cf. o cap. 5 de Mateus).
Depois que Jesus morreu, e que viram que apesar de tudo Ele estava vivo, os cristãos começaram a refletir sobre o que efetivamente lhes havia acontecido. Perceberam que havia muito mais coisa a contar e a acreditar do que as meras histórias de curas e de nova vida. Descobriram que Deus manifestou-se basicamente do lado dos seres humanos, sobretudo dos pequenos e dos pobres. "Eu te louvo, Pai, Senhor do céu e da terra, porque ocultaste estas coisas aos sábios e entendidos e as revelaste aos pequeninos" (Mt 11,25).
Cremos, assim, que Jesus, desde seu nascimento até o último suspiro na cruz, manifesta a tomada de posição de Deus em favor dos pobres. Os discípulos chegam mesmo a dizer que nele Deus se tomou homem. No "encarnar-se", no "tomar-se homem", nós apreendemos simbolicamente tudo que podemos dizer a respeito de Deus. Deus vem para a mais ínfima baixeza do homem: para os pequenos, os escravizados e condenados. Por isso falamos hoje em dia em "opção preferencial" de Deus pelos pobres. O hino bíblico canta mesmo o "esvaziamento", o "aniquilamento" de Deus em Jesus. É difícil traduzir adequadamente a palavra grega kenosis. Mas ela quer dizer que Deus se doou inteiramente aos homens, apenas permanecendo ele mesmo. Ao pé da letra se diz no mencionado hino: "Subsistindo na condição de Deus, não pretendeu reter para si ser igual a Deus. Mas aniquilou-se a si mesmo, assumindo a condição de escravo, tomando-se solidário com os homens. E apresentando-se como simples homem, humilhou-se, feito obediente até à morte, até à morte da cruz" (Filipenses 2,6s).
Foi esta visão de Deus e da realidade terrestre que Francisco e seus frades assumiram como opção pessoal. Eles quiseram testemunhar o "Deus encarnado", que se coloca do lado dos pobres.
Texto de Anton Rotzetter, Com Deus nos Dias de Hoje, p. 244 ss.
Tradução e adaptação de Carlos Almeida
sábado, 9 de fevereiro de 2008
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