terça-feira, 20 de setembro de 2011

Língua portuguesa esconde ciência nacional

Maioria das pesquisas brasileiras publicadas em revistas locais não tem versão em inglês, o que reduz a visibilidade

Número de citações por artigo dobra quando texto está em inglês; escolha do idioma da revista é 'editorial', diz especialista


SABINE RIGHETTI
FOLHA DE SÃO PAULO

O Brasil é o 13º país na lista dos que mais publicam artigos científicos. Mas, quando o assunto é quantas vezes cada texto é citado por outros pesquisadores, o país vai mal.
Isso acontece principalmente por um motivo: 60% dos artigos publicados por aqui estão em português.
E, diferentemente de países como a Espanha, boa parte dos cientistas daqui prefere publicar em revistas brasileiras.
A questão foi levantada em um evento da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), realizado na sexta-feira passada, que discutiu o desempenho dos periódicos brasileiros.
O interesse da Fapesp pelo assunto é claro: não adianta financiar as pesquisas se ninguém repercutir os resultados dos trabalhos.
"Precisamos pensar quais artigos devemos publicar só em português, só em inglês e quais devem estar nas duas línguas", disse Abel Packer, coordenador operacional do SciELO -base que reúne revistas científicas com acesso aberto na internet.

PIOR NAS HUMANAS
Em áreas como linguística, letras, artes e ciências sociais aplicadas a situação é pior.
Além dos artigos majoritariamente em língua portuguesa, cerca de 65% dos resultados de pesquisas nessas disciplinas estão em livros -que também estão em português.
"Mas em áreas como a linguística pode não fazer tanto sentido publicar em outro idioma", diz Packer.
"O ideal, claro, seria que todas as revistas tivessem também uma versão em inglês. Mas isso teria um custo muito alto", completa.
Hoje, o governo gasta cerca de R$ 5 milhões anuais com as revistas nacionais.
Mas para Luís Reynaldo Alleoni, editor da "Scientia Agrícola", da USP de Piracicaba, "passar as revistas brasileiras para a língua inglesa é um caminho sem volta."
O periódico está em inglês desde 2003. Com isso, as citações aumentaram, e o número de artigos de cientistas estrangeiros passou de 5%, em 2002, para 11% em 2010.
Parcerias também aumentam o impacto dos artigos. As citações dos estudos nacionais crescem 50% quando os trabalhos são feitos em colaboração internacional.
Para Rogério Meneghini, coordenador científico do SciELO, há uma espécie de "transferência do impacto" do artigo quando uma instituição brasileira publica um trabalho com outra estrangeira mais renomada.
"Mas, além de ter pouca colaboração entre países, o Brasil tem um número pequeno de artigos produzidos entre as próprias instituições nacionais", diz Meneghini.
O SciELO recomenda, cada vez mais, que as revistas nacionais estejam em inglês.
"Mas a escolha do idioma ainda é uma decisão editorial da revista", conclui Packer.

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