Há um ano que Cláudio nos deixou, mas sua presença através das lembranças continua forte junto à família, aos amigos e toda a sua vasta legião de admiradores, grupo do qual tive a felicidade de pertencer. A cultura do estado, que ele tanto ajudou à frente da Fundação Cultural, sente muita falta desse boêmio agitador que tanto promoveu as mais diversas tendências da rica diversidade cultural cearense.
Leiam essa rica matéria sobre o Cláudio publicada pelo jornal Diário do Nordeste.
Brindes ao boêmio
Publicado em 10 de maio de 2011
Mesmo após sofrer um acidente que o deixou paraplégico, Cláudio Pereira preservou o espírito irrequieto e boêmio, que lhe rendeu o apelido carinhoso de "Cadeira Voadora"
FOTO: MIGUEL PORTELA
Um ano após a morte do gestor e agitador cultural Cláudio Pereira, amigos realizam homenagem em bares e restaurantes
Em maio de 2010, o Ceará despedia-se de uma figura basilar para o setor da cultura no Estado. Sob a designação de "agitador cultural", o jornalista, produtor e gestor Cláudio Pereira foi responsável por múltiplos projetos na área, incentivou artistas e agregou entusiastas. Seu falecimento, aos 66 anos, em decorrência de infecção generalizada, foi uma perda não somente para amigos e família, mas para o setor da cultura.
As lembranças e os frutos do trabalho de Cláudio, no entanto, permanecem. Para celebrar essa memória, por ocasião do primeiro ano de sua morte, um grupo de amigos organizou o Circuito Cláudio Pereira. O roteiro inclui bares e restaurantes que eram preferidos do jornalista. O evento é aberto a qualquer um que queira participar.
"A ideia surgiu em um jantar com a Martine Kunz (viúva de Cláudio) e a Regina Moreira", recorda Mônica Barroso, amiga antiga do jornalista e Coordenadora Estadual de Políticas Públicas para a Mulher. "O Cláudio era incansável, e vários dos amigos tentaram acompanhar seu ritmo. Eu mesma nunca consegui. A Regina ainda aguentou por certo tempo, mas era duro. Ele ia a vários eventos culturais e sociais da cidade. Depois fazia uma peregrinação nos bares".
O Circuito começa amanhã à noite, no Bar de Seu Airton. Na quinta, é a vez do Bar do Carlinhos (no Largo do Mincharia). Na sexta, tem dobradinha: almoço no restaurante Zena e, à noite, Bar do Ciço. No sábado, tem panelada no restaurante LaVilany. Domingo é o dia mais concorrido do Circuito, e começa ainda de manhã, no Raimundo dos Queijos (Centro). Em seguida, tem almoço no Cantinho do Frango. A esticada fica por conta do Flórida Bar e termina tarde da noite no Pagode da Mocinha Quem ainda tiver fôlego, pode acompanhar os discípulos do boêmio no Bar do Pedim, na segunda-feira.
"Esses locais eram os preferidos dele, que viravam nossos preferidos também. Quem frequenta botequim sabe que o modo como a vida se desenrola ali é mais complacente com as pessoas, e que é mais fácil o afeto aflorar após umas doses de bebida ou de conversa. Muitos fatos interessantes são criados nos ambientes boêmios. Ao redor da figura do Cláudio existem mil histórias, algumas reais, outras não. Mas ele acharia todas verdadeiras", brinca Mônica.
"Registre-se que os proprietários, garçons e a própria clientela se encantavam com a presença do Cláudio. Ele era tido como um irmão ou filho. Daí a gente sempre cantava quando ele chegava: ´Com este é o oitavo botequim ....´", lembra a amiga.
Amigo e cobaia
De fato, o carinho dos proprietários pelo jornalista é sentido rapidamente, em dois minutos de conversa. "Ele frequentava minha casa antes mesmo do restaurante surgir. Nossa amizade tinha mais de 20 anos", afirma Vilani Rodrigues, que comanda o LaVilany, no Mucuripe. "Ele chamava o restaurante de ´charmoso sem placas´, porque aqui não temos placa. Quando lançávamos um prato novo, ele era a cobaia, e depois sempre divulgava", elogia a empresária. "Os pratos que ele mais gostava eram feijoada e panelada".
Essas duas iguarias também levavam Cláudio religiosamente ao restaurante Zena. "Foi uma perda grande, especialmente para nós do Centro da cidade. A região caiu muito sem sua atuação", lamenta Zenilda Bezerra, a Dona Zena. O afeto é tanto que a proprietária enche os olhos d´água ao lembrar do amigo e ao mostrar a caixa de recortes de jornal com menções ao restaurante, muitas feitas pelo próprio Cláudio. "Ele foi o primeiro a falar do Zena, da feijoada. Tinha o cantinho dele lá fora, que depois trouxemos aqui pra dentro. Toda quarta e sábado estava aqui".
O tal "cantinho" tem até placa de aviso, onde se lê "Recanto Cláudio Pereira". A figura sorridente do jornalista aparece várias vezes nos painéis de fotografias espalhados pelo restaurante, que tem 42 anos de existência. "Era uma pessoa boa. Não tenho outra palavra para descrevê-lo. Mesmo desenganado pelos médicos, na cadeira de rodas (em 1973, Pereira sofreu um acidente que o deixou paraplégico), ele tinha uma vontade de viver, uma energia que a gente sentia só de chegar perto", elogia. Não por acaso, ele ganhou o apelido jocoso de "Cadeira Voadora".
No Bar do Pedim, Cláudio também tinha mesa exclusiva. "Por coincidência, era aquela ali, onde eu estava sentado", aponta o jornalista e historiador Marciano Lopes, também amigo antigo e frequentador do bar. "Era uma pessoa admirável. É difícil para qualquer ser humano sofrer um acidente, ficar sequelado e continuar amando a vida", avalia Lopes. "Ele recuperou e trouxe para o Pedim o Clube dos Amigos da Segunda-Feira, criado por Milton Dias. Tinha shows com tocadores de violão, cantores, era bem animado", recorda. Novamente a imagem de Cláudio aparece em várias fotografias, espalhadas pelas paredes do bar. "Ele era um festeiro, uma pessoa diferente", afirma Lopes.
Sobre o número de participantes do Circuito, Mônica Barroso diz que é difícil prever. "A gente nunca sabe quantas pessoas estarão presentes em eventos para o Cláudio. Eles prescindem de formalidades, as pessoas não confirmam presença mas vão. O chamado que se faz é do prazer, é do coração e não da obrigação social", ressalta a amiga. "Creio que, como foi advertido pela morte (e driblou-a por muito tempo), tratou de viver intensamente", avalia.
Para Mônica, esse espírito irrequieto de Cláudio foi seu maior legado. "Ele foi muito mais importante, a meu ver, como modelo de vida do que como gestor cultural. O cargo apenas publicizou isso. Conheci de perto seus gabinetes, sempre de portas abertas. E sua preocupação em atender a todos", lembra.
Em 1985, Cláudio ajudou a criar a Fundação de Cultura, Esporte e Turismo (que deu origem à Secretaria da Cultura de Fortaleza), além de tê-la dirigido durante maior parte da década seguinte. "A Prefeitura viveu momentos de grandes festas e eventos culturais em toda a cidade. Lembro de bares que ele descobria na periferia e nos levava para conhecer", revela Mônica. "Depois fazia captação para manifestações culturais das redondezas. Isso ninguém pode imitar. Era algo tão natural que deixava de ser trabalho e virava uma grande festa".
Roteiro
Bar de Seu Airton (R. Tomás Acioli, próximo à Torre Quixadá) - Quarta-feira à noite
Bar do Carlinhos (Largo do Mincharia, na Praia de Iracema) - Quinta-feira à noite
Restaurante Zena (R. Meton Alencar, 549, Centro) - Almoço na sexta-feira
Bar do Ciço (R. Padre, Quinderé, 165) - Sexta-feira à noite
LaVilany (R. Olga Barroso, 331, Mucuripe) - Almoço no sábado
Raimundo dos Queijos (Travessa Crato, s/n, Centro) - Fim da manhã de domingo
Cantinho do Frango (R. Torres Câmara, 71) - Almoço no domingo
Flórida Bar (R. Dom Joaquim, 68 - Praia de Iracema) - Domingo à noite
Pagode da Mocinha (R. Pe. Climério, 140) - Domingo à noite
Bar do Pedim (R. Jorge da Rocha, entre as ruas Silva Paulet e José Vilar) - Segunda-feira à noite
ADRIANA MARTINS
REPÓRTER
http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=978114
2 comentários:
Eu, como frequentador do bra Raimundo dos queijos, por muitas vezes encontreia a figura do Cláudio Pereira. Sua chegada era sembre festejada pelos que alí estavam.
Vou tentar participar das homenagens nesse domingo.
Guto,
Cláudio, de fato, foi uma pessoa muito especial. Sabia cultivar as amizades como ninguém e viveu com total intensidade, não se importando em ser paraplégico. Considero-me o felizardo pela atenção que ele me dedicava. O fato de ser primo da Itacoeli só veio a reforçar uma amizade bem anterior a eu conhecê-la. Ele só me chamava de "meu primo" dada a grande afeição que ele tinha a mim e que era recíproca.
Eu gostaria de estar em Fortaleza para participar dessas homenagens.
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